"It’s not a conscious thing, we are like sponges, soaking up the sounds and atmospheres we are immersed in, and these influences infuse our music. Like a well blended tea. Hopefully a nice infusion!"
(Tradução livre: Não é uma coisa consciente, nós somos como esponjas, absorvendo os sons e a atmosfera em que estamos imersos, e a nossa música é uma infusão dessas influências. Como um bom blend de chás. Esperamos que seja bom!)
Angus R. Grant from Shooglenifty
Se você chegou até este site, deve ser um apreciador de música celta, este termo tão amplo que engloba tantos estilos diferentes, na origem, nos timbres, nos ritmos, todos ligados por um padrão estético e estilístico que conecta tantas diferenças. Este texto traz de forma sucinta um pouco da história de um estilo musical que colabora há 3 décadas para divulgação da música celta... conheça um pouco mais sobre o Acid Croft! No final da década de 80, na cidade de Edimburgo, Escócia, aconteceu um movimento cultural vibrante que paradoxalmente contribuiria para o "revival" da música folk escocesa. "Paradoxalmente", porque em contrapartida a outros países, onde a busca das tradições e estilos regionais emergia com força cada vez maior, lá nos pubs e casas noturnas de Edimburgo, essa retomada aconteceu através da diluição dos padrões estilísticos da música tradicional e da mistura com gêneros modernos como o rock, eletrônica, punk, jazz entre outros. Nesta época era frequente ver músicos de variadas escolas interagindo em jams que tangenciavam diferentes estilos musicais, Djs trazendo batidas eletrônicas para músicas tradicionais, gaitas de fole improvisando em grupos de jazz, rockeiros com releituras de "puirts" e canções gaélicas, um caldeirão fervente de diferentes temperos em receitas novas!
Nesta cena vibrante alguns grupos notadamente se sobressairam: a banda Swamptrash capitaneada por Harry Horse trazia um bluegrass psicodélico e vibrante, ao lado de grupos como CritterHill Varmints, Rythm Chillum entre outros... estes grupos seriam a base das bandas que trariam para o mundo um novo estilo musical chamado Acid Croft...que só teria este nome mais tarde...
Com a dissolução da banda Swamptrash, Angus Grant (o barbudo à esquerda nesta imagem), James Mackintosh (homem de preto atrás do sofá) e Malcom Crosbie (sentado no sofá, à direita), após uma temporada de busking pela Europa, decidiram desenvolver um tabalho calcado no background da música tradicional trazida pelo violinista ou "fiddler" Angus Grant, filho do lendário violinista canhoto de Lochaber, Aonghas Grant (uma personificação da herança cultural e musical das terras altas da Escócia) mas desta vez o tradicional deu lugar a grooves e levadas modernas, além de riffs e harmonizações completamente fora da escola folclórica. Mais tarde juntaram-se a eles Iain Macleod, Conrad Molleson e Garry "Banjo" Finlayson, estava formada o Shooglenifty, baluarte e carinhosamente chamados de "godfathers" deste novo estilo musical. A banda formada no inicio dos anos 90, sacudiu a cena musical escocesa com seu primeiro álbum "Venus in Tweeds" que trazia uma abordagem completamente nova para tunes tradicionais além de composições de alguns integrantes. O grupo logo ganhou notoriedade se apresentando em festivais ao redor do mundo, tornando-se uma espécie de embaixador da música tradicional escocesa, que para muitos se resumia a bandas marciais de gaitas de fole.
Assim como uma única andorinha não faz verão, um único grupo também não cria um estilo musical, e embarcando nesta arca rumo ao futuro da música escocesa entraria também um gaitero e violinista chamado Martyn Bennett, que trazia uma abordagem mais eletrônica, com sintetizadores e tracks servindo de base para que melodias de outros tempos ganhassem uma nova roupagem.
Uma banda de rock com gaitas de fole?! Sim!!! A novidade logo caiu no gosto do público e o Peatbog Faeries, assim como outras bandas como Mark Saul trouxeram um dos instrumentos mais icônicos da música escocesa pra linha de frente dos palcos.
Dos pubs de vilarejos no interior da Escócia a festivais com milhares de pessoas o Acid Croft ganhou ampla popularidade, levando aos jovens um profundo interesse pela música e cultura, sobretudo das "highlands" onde a música sobrevivera através da tradição oral passada de geração em geração.
Mas afinal de contas o que é Acid Croft?
O termo nasceu de uma brincadeira do violinista Angus Grant na busca de uma alternativa para tentar explicar a música do Shooglenifty. O termo Acid House era muito popular naquela época e foi um dos precursores de muitos estilos da cena eletrônica atual, Angus substitui a palavra house por "croft" termo usado para designar "coisas do campo" ou rurais já que o cerne da música do grupo vinha do interior das terras altas.
A história continuou e aquela coisa de "influenciar os jovens" serviu muito bem! Dos idos anos 90 até aqui a Escócia continua a presentear os ouvidos de quem gosta de música folk com misturas improváveis que trazem vida e uma constante mutação a esta cena musical.
A banda Croft No5 e os gaiteros Ross Ainslie e Ali Hutton desenvolvem trabalhos incríveis com misturas que permeiam músicas orientais, eletrônica e do leste europeu, Adam Sutherland o violinista compositor de famosa "Road to Errogie", tem um trabalho que constantemente flerta com o jazz em arranjos inusitados, os três ainda são integrantes do super combo Treacherous Orchestra que balançou as bases do mundo da música tradicional com sua sonoridade folk progressiva.
Angus Grant o criador do termo e uma das grandes influências deste estilo, faleceu em outubro de 2016, deixando um legado enorme para a cultura escocesa, contudo suas idéias continuam bem vivas. Na Escócia parecem brotar talentos para esta abordagem da música folk, celebrando bandas já consagradas como Salsa Celtica, Red Hot Chili Pipers, Afro Celt Sound System (este merece uma postagem só pra eles!) e grupos recém chegados como a Elephant Session, Elias Alexander e Hò Rò todos carregando a mesma idéia de Sir Angus Grant, fazer o público dançar!
Esta sonoridade não ficou restrita às suas origens na Escócia e mais bandas parecem adotar o Acid Croft , conhecido em outros lugares como electro-folk ou techno-folk, como estilo musical, podemos citar a sensacional Jiggy como o principal expoente irlandês deste estilo. Com videoclipes divertidíssimos a banda criou seu estilo unindo tablas indianas, uma gaita irlandesa e tunes bem conhecidas além de usar o "lilt" ou música de boca em seus arranjos e muita percussão, que nos remete a uma outra grande banda que merece por si só uma postagem única, a banda Kila, que na opinião deste vos escreve é um grupo impossível de rotular em qualquer estilo, por isso vou deixa-los aos cuidados do Pint Diário...
No final da década de 90 um violinista bastante arrojado de Cape Breton alcançou o topo das músicas mais tocadas no Canadá. Ashley MacIsaac, misturou uma tune tradicional, com batidas de funk e os vocais gaélicos de Mary Jane Lammond e "Sleepy Maggie" foi um tremendo sucesso não se limitando a cena folk, a faixa impulsionou o álbum "Hi How are you Today?" vendendo milhares de cópias e Macisaac continuou seu trabalho ora misturando gêneros ora com abordagens mais tradicionais, recentemente lançou o álbum "FDLER" em colaboração com o Dj e percussionista Jay Andrews. "Busindre reel", uma composição do brilhante gaiteiro galego Hevia, que mergulhou ainda mais fundo no mundo do techno-folk desenvolvendo nada mais nada menos que uma gaita de fole eletrônica, trouxe um músico tradicional ao topo da cena pop na Espanha, a faixa juntava um didgeridoo a batidas eletrônicas lideradas pelo timbre peculiar de uma gaita elétrica, uma junção muito feliz que aqui no Brasil fez parte de algumas coletâneas de new age.
Do País de Gales, a banda Calan oferece uma sonoridade peculiar, com vozes femininas e arranjos surpreendentes, como na música "Kân", vale conferir. Os italianos do The Sidh trazem em suas apresentações uma experiência que lembra uma rave embalada a whistles e gaitas de fole executadas de maneira virtuosística pelo seu frontman Iain Alexander Marr e...aqui no Brasil podemos citar uma galera que desenvolve a musica irlandesa com um toque de psicodelia. A banda Harmundi pode oferecer experiências sonoras e sinestésicas que te levam como uma folha pairando em uma brisa, pra outros lugares!
Há muitos grupos que não foram citados aqui, misturas que dão vida a novos caminhos sem ignorar seu ponto de partida. O intuito deste tipo de música é fazer as pessoas dançarem e, se hoje as pessoas dançam em clubes, então é lá que ela tem que estar!
Dica d'O Pint Diário: para você que está, neste momento, super curioso para conhecer todos estes trabalhos incríveis e inovadores, nós criamos esta playlist seguindo a ordem dos artistas que nosso colaborador Élcio Oliveira elencou. Para ouvir na íntegra utilize o aplicativo Spotify.
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