O álbum desse mês que O Pint Diário tem o prazer de trazer até os seus queridos leitores é o belíssimo "Afterlight", da jovem banda Ímar, lançado em 2017. Como sempre, cada um de nossos editores compartilha algumas breves observações e impressões e te convida a apreciar do seu próprio ponto de vista mais esta maravilha da música irlandesa. Comecemos, pois, com o álbum, que está disponível no Spotify do Ímar:
• PAULA CAMACHO •
Ah esse álbum!!
O primeiro set que ouvi foi há alguns anos. O L’air Mignonne. Me apaixonei na primeira porque é de uma energia sem tamanho. Acho que eu poderia ganhar a São Silvestre se eu corresse ouvindo esse set rs. Ele começa no que eu descobri ser uma Barn Dance linda em A e a surpresa vem com a virada para uma tune com marcação em 7, também em A, chamada Luke Skywalker Walks on a Sunshine (what? haha… amei esse nome). Foi com essa tune que eu tanto aprendi, quanto perdi meu medo de tunes em tempos mais quebrados (marcações em 7, 5, 13).
Depois disso comecei a prestar atenção às outras faixas e uma coisa que me chama muito a atenção são os triplets do violão (que também toca bouzouki em algumas faixas). Um elemento em que estou me espelhando ultimamente.
• MILA MAIA •
Mais um ótimo álbum para quem curte um som tradicional porém super moderno ao mesmo tempo. Quando se junta membros de Talisk, Barrule e Rura no mesmo projeto, não dá para esperar menos do que um belo álbum tocado com muita linguagem e cheio de vitalidade. Confesso que na primeira escutada pelo álbum pensei “mais uma banda com uma execução extremamente incrível, mas que lembra muito Lúnasa”. Porém na segunda escutada, já mudei de ideia. Tem algum tempero diferente no som deles, talvez pela mistura de tradição escocesa, da Ilha de Man e claro, irlandesa. Pude assistir uma vez eles ao vivo no Monroe’s Live aqui em Galway, e foi realmente um show impecável, e que para minha surpresa, a plateia sabia cantarolar várias tunes, fazendo parecer que estávamos em um baita estádio no Rock in Rio. Recomendo a experiência!
• GUSTAVO LOBÃO •
Precisão, essa é a palavra que me vem à mente quando eu ouço esses cinco músicos tocando juntos. Além da precisão, o disco é extremamente bem produzido, tem arranjos inventivos, com mudanças rítmicas, harmonias interessantes e variações de textura, e sendo um grupo de música irlandesa mas baseado em Glasgow, com dois de seus integrantes da ilha de Man, um escocês, um irlandes e um inglês, trazem um estilo bem pé-no-chão, talvez mais britânico/escocês, em oposição aos estilos leves e suingados do oeste da Irlanda.
Com membros das bandas mais modernas do trad atual (Mec Lir, Talisk, Rura, Barrule e Mànran), o Ímar parece ter como premissa ser tradicional, sem “modernices”. O que pra mim é curioso é que mesmo assim o álbum soa moderno. Não me entendam mal, isso não é juízo de valor, acho que o artigo sobre as gerações do trad que a Mila publicou recentemente ajuda a entender o que eu quero dizer. Obviamente eles todos sabem muito bem o que estão fazendo, e foram reconhecidos publicamente com várias premiações, tanto individuais como em grupo, mas se há um trad de agora, o Ímar é um bom exemplo disso, como o Planxty e o Bothy Band foram nos 70’s, Altan e Dervish nos 90’s, Danú e Lúnasa dos 2000 pra cá. Gostei especialmente de The Speckled Heifer e de The Mar.
• LEONARDO RAMOS •
Há muitos anos, quando eu estava começando a descobrir a música tradicional irlandesa, sem saber muito bem o que era aquilo e a que veio, alguém me falou, "sabe o que significa música tradicional? É música de velho caipira!" Rapaz, aquela pessoa de repente até tinha algum motivo, lá, dela, para pensar assim – mas tudo o que tenho visto e ouvido desde então testemunha o contrário. Pego logo o gancho do que dizia o meu amigo Gustavo Lobão aí em cima, com quem eu estava trocando idéia hoje mesmo no café da manhã sobre essa banda. Não se limitando a referenciar personagens populares de ficção científica em nomes de tune, como bem apontou a Paula, o Ímar tem uma pegada enérgica que cheira a shots de Red Bull com Jagermeister e colocam o ouvinte em sério risco de taquicardia. O álbum passa rápido e os sets são curtos e intensos, como um filme da Marvel que resolve rapidamente as suas cenas cheias de referências e easter eggs, com diálogos espertos e diretos e piruetas técnicas que quase sobrecarregam os sentidos extasiados. Ao fim e ao cabo, ficamos com aquela sensação de "pera, já acabou?"; um aftertaste que me lembra um pouco a brevidade e presteza dos Ramones – apesar de que o Ímar usa bem mais acordes e troca a aura revoltada por uma vibe mais ensolarada e good vibes de quem canaliza o que há de mais genuíno e cativante na música tradicional. Um passeio pelo Instagram da banda pode também ser uma experiência empolgante, que traduz a estética musical deles com exímio: em vez de tentar reinventar a roda, eles se esmeram em transpirar uma sincronicidade, uma ressonância e uma empolgação ímpar.
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